Junto com a equipe do Incor, estou na linha de frente do combate à Covid-19 desde o dia 20 de março preparando nossa instituição, colaborando no treinamento de equipe e acompanhando a evolução dos pacientes e a corrida da ciência para tentar encontrar remédio e vacina contra a doença. Mesmo com essa familiaridade e treinamento médico, tomei vários sustos e descobri uma série de coisas novas quando passei do papel de médico para o de paciente do coronavírus. Em 28 de março, comecei a ter sintomas fracos e que, aos poucos, foram se intensificando. Até hoje ainda sinto como se tivesse um resfriado persistente.
O vírus veio com tudo! Foi uma montanha-russa: começa em uma subida lenta e vai piorando, chega a um ponto mais íngreme e despenca em uma velocidade impressionante. O primeiro sinal de que havia algo de errado comigo veio com uma tosse persistente, quase sem febre (tive dois episódios). Passei a medir a temperatura todos os dias e a sentir sintomas inexplicáveis, como perda de força e prostração que variavam muito de intensidade. Passados seis dias, quando estava em casa pela manhã e programado para assistir um filme, comecei a ter uma sensação clara de que tinha um passageiro estranho em meu corpo. Sim, um alien.
Começaram algumas sensações estranhas, mal-estar, aumento da obstrução nasal, o fôlego curto, sem febre – aliás, tive muito pouca…. Chamei meu filho e esposa e falei que achava melhor ir ao hospital… A sensação é de impotência. Tive pneumonia visualizada pela tomografia e, ao observar as alterações de meus exames de sangue, meu médico, professor Rogério Souza, ordenou a internação. Daí pensei: “Pronto….”. Após o 11º dia, sendo visto muito de perto por meu médico, meu filho Thiago (que testou positivo, mas assintomático) e minha esposa Lilia (que testou positivo quando eu estava no 12º dia… e ela apresentou uma cefaleia quase intratável por três dias consecutivos, melhorando após vários analgésicos e medicação endovenosa. Quase pediu uma guilhotina!), fui melhorando gradativamente. De resquício, um resfriadinho persistente…
Estou bem agora. Mas digo: não estou pronto para outra, não! Realmente não é uma gripezinha. Nunca tinha sentido nada igual… Foi muito ruim, catorze noites mal dormidas. Como será que eu vou acordar amanhã? No momento mais surreal e triste dessa saga hospitalar, escutei buzinas de pessoas na rua protestando contra a quarentena. O Brasil é assim: por vezes, nos faz vontade de desistir de tudo. Gostaria muito de convidar uma dessas pessoas que participam desse tipo de manifestação para passar um dia dentro do hospital, vendo de perto o drama dos pacientes e o trabalho heroico das equipes médicas, expostas a riscos e a uma rotina estressante. Tudo isso para salvar mais vidas neste momento. No noticiário, sempre aparecem os médicos mais conhecidos, que merecem respeito, claro, mas os aplausos maiores deveriam ser para a turma anônima de enfermeiros e profissionais que estão ralando muito neste momento, muitas vezes em troca de salários baixos.
Não posso deixar de agradecer aos meus amigos do Incor. Apesar de ver amigos, família, eu mesmo cair diante da Covid como dominós, eu não poderia deixar de me sentir, após me recuperar, um vencedor.
E, com licença, com muita gana para voltar para a linha de frente. Vamos vencer!
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