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POLÍTICA > Senador que discutiu com Marina assinou jabutis que elevam conta de luz e poluição

por Ornan Serapião
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Por Fábio Pupo | Folhapress

O senador Marcos Rogério (PL-RO), que em audiência na última terça-feira (27) falou para a ministra Marina Silva (Meio Ambiente) se colocar em seu lugar, assinou uma proposta com uma série de itens que tornam a matriz elétrica brasileira mais poluente e podem sair do papel a depender de análise do Congresso prevista para o mês que vem. O custo é de R$ 545 bilhões na conta de luz dos brasileiros.

O parlamentar foi o responsável no Senado pelo parecer da MP (medida provisória) enviada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) ao Congresso, em 2021, que permitia a privatização da Eletrobras. O texto original dava aval à venda e estabelecia, entre outros pontos, qual seria o modelo de transferência para a iniciativa privada.

No documento de sua autoria, o senador aceitou logo no primeiro artigo uma proposta nascida na Câmara dos Deputados que previa a contratação pelo país de uma série de termelétricas —algo sem relação com o tema da proposta original— o que, na política brasileira, é chamado de jabuti, em referência a um ditado, usado por diferentes políticos ao longo da história, segundo o qual jabuti não sobe em árvore sozinho e, se está ali, teve a ajuda de alguém.

Em grande parte, a compra de energia seria sob o regime inflexível –isto é, de geração obrigatória e constante, inclusive quando não houver necessidade.

Na justificativa de sua versão da MP, o senador afirmou que as medidas pró-térmicas diversificariam a matriz elétrica brasileira diante do que chamou de um parque gerador “excessivamente dependente de hidrelétricas”. Além disso, afirmou –ao contrário do calculado de forma reiterada por especialistas e consultorias do setor– que haveria “economia para os consumidores”.

“A contratação de termelétricas a gás natural e pequenas centrais hidrelétricas, somada à prorrogação dos contratos do Proinfa [subsídio a fontes alternativas], resultará na diminuição da tarifa de energia elétrica”, afirmou o senador no texto.

Ele também disse que a medida poderia levar o gás natural ao interior do país e reduzir desigualdades. “O fluxo do gás natural Brasil adentro, tendo Minas Gerais como o grande hub de gasodutos, permitirá que regiões atualmente de baixo dinamismo econômico possam desfrutar de maior progresso e bem-estar”, escreveu.

O senador foi procurado na quarta-feira (28) por ligação e mensagem de WhatsApp pela reportagem, que também enviou email para o gabinete. A assessoria de imprensa do parlamentar também foi contatada por mensagem e ligação telefônica. Mas não houve retorno até a publicação deste texto.

A proposta foi aprovada pelo Congresso e depois sancionada por Bolsonaro sem veto a esse trecho. Foram 8.000 MW (megawatts) de expansão compulsória de termelétricas a gás inseridos na lei.

As térmicas são vistas por especialistas como necessárias para o país, mas não no regime inflexível. A adoção de tamanha contratação e sob esse modelo faz as projeções oficiais para o setor elétrico nos próximos anos irem na contramão do esforço contra o aquecimento global. A previsão é que a matriz de geração no país, hoje uma das mais limpas do mundo, fique menos renovável.

Com as contratações previstas, o cenário principal projetado pela EPE (Empresa de Pesquisa Energética) –estatal vinculada ao Ministério de Minas e Energia– é que o volume de emissões resultantes da geração de eletricidade cresça 84% até 2034, para 26,9 milhões de toneladas de CO2eq (dióxido de carbono equivalente). O chamado grau de renovabilidade da matriz elétrica cairia de 94% para 89%.

Por enquanto, os leilões dessas termelétricas não têm ocorrido. Do total previsto, apenas 754 MW já foram contratados e 7.246 MW aguardam um próximo certame. Isso porque falta interesse da iniciativa privada nos leilões devido à existência de um preço-teto para a contratação.

Agora, para viabilizar as contratações, o Congresso inseriu um jabuti semelhante no projeto de lei das eólicas offshore –aprovado no fim do ano passado. Na prática, a nova iniciativa aumentaria o preço-teto das usinas e viabilizaria a construção de dutos de gás natural até as cidades das termelétricas, com seus custos arcados pelo consumidor de energia.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou o dispositivo no começo deste ano após consenso entre quatro ministérios, entre eles o do Ministério do Meio Ambiente. A pasta comandada por Marina Silva afirmou em posicionamento oficial na época que o projeto “prorroga a contratação de termelétricas a gás natural e carvão até 2050, contradiz os esforços climáticos do país, como o Acordo de Paris, e representa um retrocesso ambiental, econômico e político”.

Agora, o Congresso planeja derrubar a decisão de Lula e destravar o mecanismo. O governo foi avisado de que há votos suficientes para ressuscitar os jabutis e a análise está prevista para o dia 17 de junho.

Diante do temor de que o Congresso retome as medidas por completo, o governo quer negociar com parlamentares a aprovação de uma série desses itens para evitar a derrota no ponto de maior impacto do texto –as termelétricas.

A estratégia é oferecer apoio a outros trechos, como medidas que beneficiam carvão e PCHs (pequenas centrais hidrelétricas) e prorrogam o Proinfra (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica) –que concede benefícios tributários a fontes como eólicas e biomassa.

De acordo com a consultoria PSR, em números atualizados em janeiro de 2025, ao todo os novos jabutis da proposta elevam custo para o consumidor em R$ 20 bilhões de reais por ano até 2050, o equivalente a R$ 545 bilhões até o horizonte em valores corrigidos. O estudo afirma que isso representaria um aumento de 9% no custo de energia, com reflexos diretos na inflação, no poder de compra da população e na competitividade industrial no país. Com BN

Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

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