O famoso “livrinho”, promulgado em 05 Out 1988, traz em seu preâmbulo:
“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil”.
Ao longo de mais de uma centena de páginas e mais de duas centenas de artigos, podemos identificar que o constituinte originário, apesar de ter adotado um espírito mais progressista/socialista do que conservador escreveu e votou que os Poderes da República devem ser “independentes e harmônicos entre si”.
Ainda que exista a hipótese do exercício de funções atípicas dos Poderes da República, sendo este a base dos freios e contrapesos, o que se observa é que nos últimos três anos – em especial após a troca do comandante do Poder Executivo, o comportamento de determinadas figuras da Alta Corte da Justiça do Brasil, extrapola, e muito, o que preceitua o Art. 2° de nossa Carta Magna, ao que se observa, está sendo deixada de lado, perigosa e deliberadamente por aqueles que deveriam ser os seus “guardiões”.
Em especial ao Chefe do Poder Executivo, viu-se a abertura sequenciada de inquéritos contra atos de sua atribuição privativa, consoante o Art. 84, por decisão de magistrado do STF, ferindo inclusive a estrutura acusatória da persecução penal, onde se instauram procedimentos inquisitórios sem mesmo ouvir o Procurador Geral da República, restando como ampla, geral e irrestrita desobediência ao “Livrinho”.
Se tal descompasso se dá com o chefe do Poder Executivo, não diferente reverbera em relação aos seus correligionários, visto que tal desobediência também se estende em desfavor Deputados e Senadores aliados e, mais uma vez, ao arrepio da nossa Constituição e em total desacordo com o Art. 53°, passou-se a violar, civil e penalmente, membros do parlamento brasileiro, legítimos representantes do povo, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos, desconsiderando a sua imunidade Constitucionalmente prevista.
Alguns membros da elite do poder judiciário brasileiro extrapolaram as suas funções, cada vez mais entrado em searas que não lhe competem, afinal de contas, conforme preceitua o §1° do Art. 103, “O Procurador-Geral da República deverá ser previamente ouvido nas ações de inconstitucionalidade e em todos os processos de competência do Supremo Tribunal Federal”.
Vejam, se um grupo de brasileiros, legítimos representantes do povo, reuniu-se para discutir e aprovar uma Carta Magna, por qual motivo uma elite político-judiciária, se valendo da toga e da cadeira que ocupam, faz prevalecer um simples Regimento Interno ou mesmo uma simples “canetada” em detrimento da nossa Lei maior.
O que nos surpreende mais ainda é a passividade e o silêncio dos demais órgãos da Justiça brasileira, bem como daqueles que legalmente deveriam coibir abusos destas autoridades que afrontam ao princípio da independência e harmonia entre os Poderes.
Ainda na mesma CF/88, temos que no capítulo dos Direitos e Garantias Individuais está escrito no Inciso V do Art. 5° que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, trazendo ainda no Inciso XVI, que “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais aberto ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”.
Pois bem, mais uma afronta aos direitos individuais é caracterizada, quando um dos supremos ministros do STF determina a abertura de processos contra cidadãos que se reuniram em locais abertos para demonstrar seus posicionamentos a favor da democracia.
E as afrontas não param: outro poderoso ministro, presidindo a corte eleitoral maior, além de ter “brincado” que “eleição não se vence, se toma” e ter dado explicações esdruxulas sobre, age politicamente a fim de negar meios que viabilizem uma possibilidade de auditamento no uso das urnas eletrônicas e de novos meios de segurança quanto às ameaças que todo e qualquer meio eletrônico pode receber. Este mesmo que silenciou sobre a invasão de Hackers ao Sistema Eleitoral, minimizando tal atitude, que de fato expôs essa vulnerabilidade existente em toda e qualquer parte do mundo, entretanto, para essa figura impoluta da Justiça, as urnas brasileiras são invioláveis.
E para piorar, quiseram imputar ao Presidente da República crime por suposta divulgação de conteúdo de uma investigação sobre essa invasão ao sistema eleitoral brasileiro que sequer estava em sigilo, mais uma vez, sem ouvir o Procurador-Geral da República, intimando-o para prestar depoimento presencialmente na sede da Polícia Federal, o que nunca ocorreu com nenhum presidente em exercício.
Nesse sentido, diante de tamanha diligência com os outros poderes da República, onde estavam Vossas Excelências nos últimos 20 anos de Brasil? Por qual motivo essa estrutura inquisitória não se versou sobre o maior esquema de corrupção da história da humanidade? Seria talvez porque o “amigo do amigo do meu pai”, solto e tornado elegível por vocês os tenha revestido da toga e o sistema não se adaptou à vontade popular, que repito, não os colocou nessa cadeira?
Mestre Ruy Barbosa tinha razão: “A pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer”.
E onde iremos parar? Bem, isso somente a história poderá nos dizer.
Que venham as cenas dos próximos capítulos.
General Girão. O autor é deputado federal.
Opinião publicada originalmente no jco, em 22.02.2022