Criação do Conselho da Amazônia e da Força Nacional Ambiental, se concretizada, tem tudo para ser um bom passo na direção da formulação de uma política ambiental realista
Depois de um ano de bravatas, caneladas e falta de rumo na área ambiental, o governo de Jair Bolsonaro afinal tomou uma iniciativa que, se for conduzida com propriedade, pode ajudar a reverter o desastroso desempenho do Brasil nessa seara, considerada crucial para o desenvolvimento.Trata-se do anúncio da criação do Conselho da Amazônia, cujo objetivo, segundo o presidente, será coordenar as ações de vários Ministérios em projetos para a proteção e o desenvolvimento sustentável da Amazônia. Na mesma linha, o governo informou que será criada uma Força Nacional Ambiental, em articulação com os Estados da região, destinada a combater o desmatamento e outros crimes ambientais.São ações de quem parece ter entendido a gravidade do problema – mesmo que tenha sido mais por pressão do que por convicção. O desmatamento na Amazônia vem batendo recordes, mas esse desastre foi tratado com desdém pelo presidente Bolsonaro e por seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. As críticas ao governo foram interpretadas ou como intriga de países europeus interessados em prejudicar o agronegócio brasileiro ou simplesmente como invenções destinadas a alimentar uma conspiração internacional com o objetivo de violar a soberania nacional. O simples fato de que o governo tomou alguma atitude com contornos institucionais para enfrentar o problema deve ser, portanto, comemorado, ainda que quase nada se saiba sobre o formato do Conselho da Amazônia.Até ontem, não havia informações sobre o que norteou a criação do Conselho nem como será composto ou como funcionará. Também não se sabia qual o volume de recursos necessários para bancar a empreitada. O que se sabe oficialmente é que o Conselho será coordenado pelo vice-presidente Hamilton Mourão, e que a estrutura da nova entidade ficará na própria Vice-Presidência.Parece prudente entregar essa tarefa a Mourão, que conhece bem a região amazônica e ademais mostrou-se até aqui bem mais ajuizado que o ministro do Meio Ambiente. Pode soar estranho que uma iniciativa tão importante na área ambiental não tenha à testa o ministro da área, mas, nesse caso, a decisão faz todo o sentido, pois o ministro Ricardo Salles é um dos grandes responsáveis pela forte degradação da imagem do Brasil em relação à questão ambiental, graças principalmente a seu comportamento às vezes intempestivo em encontros internacionais sobre o clima. É preciso, portanto, aumentar o teor de serenidade no comando de ações governamentais destinadas a mitigar o desastre ambiental na Amazônia, e o vice-presidente Mourão em princípio atende a esse requisito.Não parece ser coincidência que o anúncio da criação do Conselho da Amazônia tenha ocorrido no momento em que o ministro da Economia, Paulo Guedes, está em Davos (Suíça), no Fórum Econômico Mundial, para apresentar a investidores estrangeiros oportunidades de negócios no Brasil. Como era esperado, esses investidores cobraram do governo brasileiro uma política ambiental séria, pois atualmente não se concebem negócios, em qualquer lugar civilizado do mundo, sem levar em conta a questão da preservação do planeta, hoje a principal preocupação de parte significativa dos consumidores. O típico discurso bolsonarista adotado pelo ministro Guedes em Davos, segundo o qual “o pior inimigo da natureza é a pobreza, as pessoas destroem o meio ambiente porque precisam comer”, tem cada vez menos espaço num mundo que rejeita a destruição das florestas em nome do desenvolvimento econômico dos países emergentes. E, no caso do Brasil, porque a devastação não é feita por famélicos, mas por criminosos em busca de ganhos fáceis e rápidos. Pouco importa se a intenção de Bolsonaro, ao anunciar a criação do Conselho da Amazônia, seja a de tentar melhorar a imagem brasileira no exterior, desgastada pelo próprio presidente em reiteradas declarações hostis ao lidar com o problema ambiental desde que tomou posse. O que interessa é que a iniciativa, se passar do discurso à prática, tem tudo para ser um bom passo na direção da formulação de uma política ambiental realista, conjugando os interesses econômicos com os imperativos climáticos, condição sem a qual é impossível pensar em desenvolvimento sustentável.