Por Olívia Coutinho
Laço no cabelo, vestido rodado, enfeitado com rendas, sapatinhos com fivelas e meias coloridas! Pronta pra mais um passeio: casa da vovó, festa na Igreja, ou passeio de trem!
Tudo muito belo, mas o que eu mais gostava mesmo, era da minha liberdade, ou seja: de chegar em casa, me livrar logo daquele vestido quente e dos sapatinhos quase sempre apertados!
Minha maior alegria, era poder sair correndo pelo quintal, livre como um passarinho! Nada era melhor do que que molhar os pés lá na lagoa, dando migalhas de pão para os peixinhos, escorregar na casca do coqueiro morro abaixo, pra cair lá no riacho, pegar carona no carro de boi, pra ir na roça, ver o plantio ou a colheita do arroz do milho e do feijão e aprender com os lavradores a olhar a hora através do sol…
Uma das tarefas que eu mais gostava, era, de ir lá no meio do mato, buscar alecrim do campo, usado como vassoura na limpeza do terreiro! Era aquela felicidade: estar em contato íntimo com a natureza, conhecer os segredos dela…
Era tudo como que mágico: sentir o frescor da brisa espalhando meus cabelos, misturar meu canto com o canto dos passarinhos, me perder no meio das flores do campo, em busca da flor mais bela, que eu levaria pra minha mãe! Colocava no pescoço minha medalhinha de São Bento, amarrada num barbante, calçava meu sapatinho tipo botinha e me punha a caminho! Meu cachorrinho, chamado Fiel, ia na frente, latindo até nas borboletas e eu, saltitando, fazendo trilhas no capim, seguia rezando assim: “São Bento, água benta, nosso Senhor Jesus Cristo no altar, afasta bicho mal deixa filha de Deus passar… Com esta pequena oração ensinada por minha mãe, eu me sentia protegida contra as cobras que eram muitas por ali…
Mamãe sempre me recomendava: “Filha, nunca chegue perto do precipício”. Mas um dia, atraída por uma arvore com lindas flores, bem à beira do precipício, não resisti, acabei seduzida por tamanha beleza, esquecendo das recomendações da minha mãe! E no desejo de apanhar as flores dos galhos mais alto, as mais lindas, acabei desiquilibrando caindo lá no precipício. Olha aí, o preço da minha desobediência! O acidente, só não foi pior, porque fiquei agarrada num espinheiro, que não me deixou rolar pro fundo. Refeita do susto, eu consegui com muito custo, voltar pro topo, me agarrando num “cipó de São João.”
Chegando em casa, cheia de arranhões, nem tive coragem de olhar nos olhos da mamãe, completamente envergonhada pela minha desobediência! Além da bronca, como castigo, minha mãe limitou o meu espaço só em volta da casa, ao alcance dos olhos dela! Não podia haver castigo pior, privar-me daquilo que eu mais gostava: estar em contato íntimo com a natureza, até meu cachorrinho ficou entristecido, ficava latindo sem parar, lá na beira do riacho, como que querendo me chamar pra novas aventuras…
Fui ficando cada dia mais triste, nem com minhas bonecas queria mais brincar e a mamãe, percebendo o tamanho da minha tristeza, suspendeu o meu castigo! Neste dia, dei pulos de alegria, saí correndo pelo o quintal, livre como um passarinho, que acabava de ser solto da gaiola!
Um dia, forçadamente, tive que deixar este meu paraíso, pra morar na cidade grande. Mas sempre guardarei comigo, as doces lembranças daquele meu paraíso encantado…
História real.
De Olivia Coutinho