No Brasil, o antiparasitário faz parte do polêmico “kit covid” defendido pelo presidente Jair Bolsonaro
A mesma plataforma de pesquisa que desbancou a azitromicina como tratamento potencial para a covid-19 incluiu, agora, a ivermectina nos estudos de drogas a serem testadas contra a doença causada pelo Sars-CoV-2. Liderada pela Universidade de Oxford, a Plataforma de Ensaio Randomizado de Tratamentos para Epidemias e Doenças Pandêmicas (Principle, na sigla em inglês) é o maior ensaio clínico mundial de possíveis medicamentos para a enfermidade, realizado em 1,4 mil centros britânicos. No Brasil, o antiparasitário faz parte do polêmico “kit covid” defendido pelo presidente Jair Bolsonaro, embora não exista comprovação da eficácia do vermífugo para combater a infecção por Sars-CoV-2. Em abril, a Principle assegurou a eficácia do primeiro medicamento anticovid para ser utilizado em casa, a budesonida inalada. Os estudos demonstraram que a substância pode reduzir o tempo de recuperação em uma média de três dias. Até o momento, esse foi o único de cinco remédios que passou nos testes. Agora, além do antiparasitário ivermectina, os cientistas investigam a ação do antiviral para influenza favipiravir. Em nota, o investigador-chefe adjunto da Principle, Chris Butler, justificou os testes com a ivermectina afirmando que ele está disponível em todo o mundo, é utilizada para outras doenças infecciosas e vem sendo “amplamente usado para tratar covid-19 em vários países”. “Esperamos gerar evidências robustas para determinar a eficácia do tratamento contra covid-19 e se há benefícios ou danos associados ao seu uso.” O estudo vai incluir voluntários de 18 a 65 anos que testarem positivo para Sars-CoV-2. Pessoas com doença hepática serão excluídas.
Ponto final
Para Stephen Griffin, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Leeds, na Inglaterra, o estudo deve colocar um ponto final nos questionamentos sobre a eficácia do vermífugo para a covid-19. “De forma muito parecida ao que aconteceu antes com a hidroxicloroquina, tem havido uma quantidade considerável de uso off-label dessa droga, baseado principalmente em dados de cultura de células in vitro. No entanto, os efeitos antivirais só foram demonstrados em tais sistemas em concentrações muito mais elevadas do que as correspondentes ao tratamento antiparasitário de rotina”, diz. “Existem numerosos estudos e metanálises que apoiam o uso de ivermectina para terapia contra covid, mas não há estudos clínicos randomizados, e muitos outros pequenos estudos não mostram nenhum benefício, incluindo um artigo recente publicado na revista The Lancet”, alerta. Segundo Griffin, “o perigo desse uso off-label é que, assim como a hidroxicloroquina, o uso da droga passa a ser impulsionado por grupos de interesse específicos ou proponentes de tratamentos não convencionais e se torna politizado. Digno de nota, a Merck, o fabricante da ivermectina, afirma categoricamente que ela não é recomendada para terapia contra covid e a Organização Mundial da Saúde (OMS) estipulou que não deve ser usada fora de um ambiente de ensaio clínico”. (CB)