Pesquisa da Faculdade de Saúde Pública da USP sobre esgotamento profissional mostra que professores precisam de apoio para solucionar conflitos nas escolas
A violência, infelizmente, está presente nas escolas do País. E não é de hoje. Casos de bullying, brigas entre alunos e agressões verbais ou físicas contra professores aparecem com frequência em levantamentos realizados nas redes de ensino. As consequências, por óbvio, são negativas para todos: além de prejudicar o convívio e a aprendizagem, uma rotina de violência pode afetar também o bem-estar emocional e a saúde dos profissionais da educação. De súbito, quem tem a missão de ensinar e de servir de exemplo vê-se esgotado, o que leva muitos professores, não raro, a faltar ao trabalho ou a sair de licença médica, interferindo no funcionamento das escolas.
O esgotamento profissional, chamado também de burnout, é frequente em diversas profissões, como o magistério. Administrar as tensões da sala de aula, deparar-se com falta de infraestrutura e lidar com problemas de gestão já são desafios suficientes. O que dizer, então, quando entra em cena a variável da violência, seja na forma de agressões físicas ou verbais por parte de alunos, pais, responsáveis e colegas de trabalho? Considerando que o Brasil tem 2,2 milhões de professores na educação básica, atuando em 178 mil escolas, percebe-se o tamanho do desafio.
A propósito dessa realidade muito conhecida, mas pouco estudada, uma pesquisa da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) é bastante esclarecedora. A partir de entrevistas com 93 professores da rede municipal de São Paulo orientados a buscar apoio psicoterápico e que efetivamente procuraram o ambulatório de saúde mental do Hospital do Servidor Público Municipal, o levantamento identificou variáveis ligadas ao esgotamento profissional. Entre elas, ruídos em sala de aula, problema mencionado por 87% dos professores com algum grau de burnout, e incômodos com alunos, variável citada por 70%, conforme o Jornal da USP.
A violência física ou psicológica, claro, está na lista. E apresenta elevada correlação com casos graves de burnout. Dos 93 participantes do estudo, a maioria mulheres, 25 foram identificados com quadro grave de esgotamento em dois testes com metodologias distintas aplicados durante a pesquisa. Dos professores com burnout grave, 60% relataram ter sofrido agressões físicas ou verbais, principalmente ameaças ou constrangimentos, dentro da escola, nos 12 meses anteriores à entrevista.
Os resultados foram publicados no artigo Violência contra professores da rede pública e esgotamento profissional, em março deste ano. As autoras, a doutoranda Elaine Cristina Simões e a professora da USP Maria Regina Alves Cardoso, defenderam que a violência nas escolas seja considerada também como dano ocupacional, já que se insere entre as prováveis causas de esgotamento. Outro ponto interessante é que as agressões, sem dúvida, contribuíram para o diagnóstico que deu origem à recomendação de que os profissionais buscassem apoio psicológico. Mas, conforme as autoras, a violência parece tão arraigada no ambiente escolar que as agressões não ensejaram, isoladamente, a procura por tratamento psicoterápico.
As pesquisadoras jogaram luz sobre como pode ser difícil, para professores, lidar com a violência de que são vítimas nas escolas, considerando que se trata de ambiente diversificado, onde, em princípio, caberia ao docente fazer a mediação. “É esperado que o educador lide com os conflitos na perspectiva da formação dos alunos, portanto, quando o alvo da violência é o próprio professor, a agressão pode ser vista por ele como sinal de seu fracasso”, escreveram elas.
As conclusões das pesquisadoras da Faculdade de Saúde Pública da USP precisam chegar aos gabinetes não apenas da Secretaria Municipal da Educação de São Paulo, mas das demais redes de ensino em todo o País. É notório que a educação enfrenta desafios multifacetados e que seus profissionais precisam de apoio para enfrentá-los. A resolução de conflitos, uma das causas de burnout, tem que fazer parte da formação inicial e continuada de professores. Pela saúde dos profissionais e de seus alunos e pelo bem da educação.