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EDITORIAL ESTADÃO: A safra, o apetite global e as barreiras

por Ornan Serapião
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Produtores terão substancial crédito para plantar, abastecer o País e continuar exportando, mas cresce o risco de mais protecionismo europeu, sob pretexto da preservação ambiental

O Estado de S.Paulo

Setor mais eficiente da economia brasileira, a agropecuária terá dinheiro para continuar produzindo, na próxima temporada, comida mais que suficiente para o mercado interno e para a exportação, se os R$ 340,88 bilhões definidos para o crédito forem liberados a tempo e bem aplicados. O valor fixado para o Plano Safra 2022/23 é 36% maior que o do período anterior. Os empréstimos serão parcialmente subsidiados e isso deverá atenuar os efeitos da elevação dos juros. Com financiamento adequado, o agronegócio poderá continuar faturando com a crescente demanda internacional de alimentos, prevista para aumentar ao ritmo anual de 1,4% até 2031.

Não basta, no entanto, no caso do mercado interno, garantir produção suficiente para abastecer as bancas de feiras e as gôndolas de supermercados. Segundo a Fundação Getulio Vargas, em 2021 cerca de 23 milhões de pessoas, 10,8% da população brasileira, estavam abaixo da linha da pobreza, correspondente a R$ 210 per capita. Foi o quadro mais grave desde 2016. Agravada pelo desemprego, pela baixa remuneração e pela alta de preços, a pobreza tem resultado em fome para dezenas de milhões, embora haja muito alimento nos estoques e em oferta no varejo.

Do lado internacional, as perspectivas continuam boas para os produtores e exportadores brasileiros. Em maio, o setor faturou US$ 15,11 bilhões com as vendas externas. Esse novo recorde foi facilitado pela alta das cotações. Em 12 meses houve aumento de 29,2%, segundo a FAO, órgão das Nações Unidas para agricultura e alimentação. Inflados pela retomada econômica pós-pandemia, esses preços tendem a recuar e a estabilizar-se, de acordo com estudo conjunto da FAO e da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mas a demanda continuará a crescer, puxada principalmente pelas economias emergentes e em desenvolvimento.

A oferta global de alimentos deverá aumentar cerca de 1,1% ao ano, segundo esse relatório, e os países da América do Sul e do Caribe terão, provavelmente, uma participação importante nesse movimento. Um papel de relevo é previsto para o Brasil.

Se a agropecuária continuar a investir e a modernizar-se, a participação brasileira quase certamente ficará bem acima da taxa de crescimento – 1,1% ao ano – estimada para o conjunto. Segundo projeção do Ministério da Agricultura, a produção nacional de grãos deverá passar de 262,1 milhões de toneladas, volume então atribuído à safra de 2020/21, para 333 milhões na temporada 2030/31, com expansão anual média de 2,4% ao ano, ou 27,1% no período. Para a produção total de carnes foi calculado um aumento de 27,4 milhões para 34 milhões de toneladas nesse período, com variação acumulada de 24,1%.

Pelas mesmas estimativas, a área destinada ao plantio de grãos no Brasil passará de 68,7 milhões de hectares para 80,8 milhões, com acréscimo de 17,6%. O volume colhido continuará, portanto, aumentando muito mais que a área ocupada, como no último meio século. Os ganhos de produtividade agrícola, no País, têm resultado principalmente do trato do solo, condição para o aumento da produção por hectare.

Sendo poupadora de terras, a eficiência da agricultura favorece a preservação do meio natural, incluídas, é claro, as florestas. Conhecida há muito tempo, essa característica da produção nacional é desprezada ou negada quando políticos, produtores e consumidores europeus acusam os brasileiros de devastação florestal.

Essa política, mantida e expandida a serviço do protecionismo comercial, pode ser reforçada com a bandeira do desmatamento zero, recém-levantada por ministros do Meio Ambiente da União Europeia. Essa bandeira será apresentada ao Parlamento Europeu para a proibição de importações de vários produtos, incluídos carne bovina, soja, cacau, café e madeira. Não basta um bom Plano Safra. Cabe também ao poder central, por meio da diplomacia, combater o protecionismo e preservar a imagem do agronegócio, manchada principalmente, é preciso lembrar, pela política antiambiental do presidente Jair Bolsonaro.

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