Por: Ranier Bragon e Thaísa Oliveira/Folhapress
A Câmara dos Deputados e o Senado retornaram do recesso no último dia 1º, mas só formalmente. Na prática, nenhuma das duas Casas teve votações de relevo no plenário nem instalou as suas comissões permanentes, espécie de pontapé inicial do ano legislativo.
O trabalho para valer só deve começar em março, após o Carnaval. E a justificativa apresentada pelos parlamentares é quase sempre a mesma: sempre foi assim.
O primeiro dia de trabalho, um sábado, foi marcado por um Congresso cheio para as eleições de Hugo Motta (Republicanos-PB) na presidência da Câmara e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) na do Senado. A partir daí, porém, o esvaziamento foi a tônica.
O próprio Motta reconheceu nesta quinta-feira (13) que a instalação das comissões da Câmara ficará para depois do Carnaval. “Os líderes estão começando a discutir internamente, porque sempre tem um conflito. Mais de um partido sempre prioriza as comissões mais importantes. Espero poder resolver isso nos próximos dias e no início de março fazer a instalação”, afirmou.
Neste ano, em especial, a definição de quem irá comandar as 30 comissões permanentes da Câmara e as 16 do Senado ganhou mais importância devido à expectativa de que, a partir de 2025, elas comandem de fato parte da distribuição de R$ 11,5 bilhões de emendas parlamentares no Orçamento.
Até o ano passado, as emendas de comissão eram direcionadas pelas cúpulas da Câmara e do Senado, sem praticamente nenhum poder de decisão das comissões em si. A partir de decisões do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino bloqueando a execução de parte delas, há possibilidade de que neste ano as comissões assumam um protagonismo maior em relação a essa fatia das verbas federais.
Além disso, o início de fato dos trabalhos no Congresso tem sido afetado por uma espécie de compasso de espera de partidos de centro-direita e de direita pela prometida reforma ministerial de Lula (PT).
A partir do novo desenho da Esplanada é que se saberá qual será o real ritmo e humor do Congresso, dizem parlamentares.
Na Câmara, a definição das comissões esbarra também na queda de braço entre PL e PT, as duas maiores bancadas da Casa.
O PL tem direito a fazer as duas primeiras escolhas de comissão, das seis que pode ocupar, mas isso sempre passa por acordos políticos.
O pacto firmado ainda na gestão de Arthur Lira (PP-AL), por exemplo, definiu que a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), a principal da Casa, será comandada por MDB em 2025 e União Brasil em 2026.
O PT, que tem direito a cinco comissões (sendo a terceira e a quinta indicações), quer ficar com Fiscalização Financeira e Controle, que já comanda hoje, e com Educação, que, em 2024, foi presidida por um dos mais barulhentos líderes da oposição, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG).
Tudo isso depende de acordos que serão selados até o Carnaval. O líder da bancada do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), disse que o partido ainda não definiu as comissões ou nomes, mas que não abrirá mão de suas seis vagas —um acordo da gestão passada reservava ao partido de Bolsonaro apenas cinco vagas.
Uma comissão de interesse da legenda é a de Relações Exteriores e Defesa Nacional, que seria comandada por Eduardo Bolsonaro (PL-SP).
No Senado, as presidências das comissões de peso já foram divididas entre os partidos, a partir do tamanho de cada uma das bancadas. Mesmo com o desenho fechado, Alcolumbre tem dito que aguarda a indicação dos membros por parte dos blocos partidários.
Senadores dão diferentes datas para a instalação das comissões permanentes, rito que formaliza o presidente e o vice de cada colegiado. Parte dos líderes afirma que, mesmo que as comissões sejam instaladas neste mês, só haverá votações depois do Carnaval.
Desde a posse, só um evento entrou oficialmente na agenda do Senado, a reunião da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das apostas esportivas. O relator, senador Romário (PL-RJ), apresentaria o relatório final na terça (11), mas a agenda foi desmarcada horas antes.
Na CPI das Bets, a promessa do presidente, senador Dr. Hiran (PP-RR), é retomar os trabalhos na semana que vem. O encontro do grupo, porém, ainda não entrou no calendário.
O esvaziamento do Senado ficou ainda mais nítido na terça-feira (11), quando Alcolumbre escolheu a residência oficial da presidência, em vez do gabinete da Casa, para receber os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Simone Tebet (Planejamento) e Alexandre Padilha (Relações Institucionais).
Em outra agenda “home office”, o presidente do Senado se reuniu, em casa, com o ministro do Supremo Gilmar Mendes e um grupo pequeno de senadores para tratar do marco temporal das terras indígenas.
Imagem: Michel Jesus/ Divulgação Câmara dos Deputados