Ter o direito fundamental a acompanhante violado e entrar em uma sala de parto sozinha, desamparada e com medo. Essa tem sido a realidade de gestantes em algumas maternidades do país, sobretudo as públicas. A justificativa dos hospitais para ferir a garantia ao suporte maternal, assegurada pela Constituição, tem sido a de evitar aglomerações devido ao novo coronavírus. A medida vai contra as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Logo que a pandemia começou, o órgão emitiu um manual de orientações para assistência ao parto. Nele, a presença de um acompanhante à escolha da gestante é garantida, devido sua importância para o bem-estar psicológico da futura mãe.Atuante na área de violência obstetrícia, a brasiliense Ruth Rodrigues faz parte de um coletivo de mulheres advogadas que criou um documento contra a relativização e mitigação desse direito. Na nota, elas dão recomendações às grávidas do que fazer caso seja negado o amparo de assistência. “Depois de termos conhecimento de que várias maternidades estão violando o direito, resolvemos emitir, em conjunto com instituições de assistência humanizada, uma nota explicando que as mulheres têm direito ao acompanhante, mesmo em tempos de pandemia. A orientação em casos de infração é prestar denuncia à Vigilância Sanitária ou ao Ministério Público”, pontua Ruth. Ela explica que a restrição pode ocorrer, excepcionalmente, quando a gestante ou o acompanhante apresentam sintomas da Covid-19. Nesse caso, o impedimento deve ser justificado em prontuário médico.A defensora revela que, até o momento, não há casos relatados no Distrito Federal. Para não somar às vítimas, a estudante Joyce Marina, grávida de 36 semanas, luta na Justiça para conseguir uma liminar que garanta a presença do marido dela no nascimento do primeiro filho do casal. “A maternidade pública na qual pretendo parir está proibindo acompanhantes, e as parturientes estão ficando sozinhas. Minha data provável de parto é no fim deste mês, e esperamos que, até lá, meu esposo possa estar comigo tanto no parto quanto no pós-parto”, conta a moradora de Maceió, em Alagoas. A jovem de 24 anos entrou, junto a outras grávidas, com uma ação no Ministério Público do Estado de Alagoas (MPE/AL). “Até o dia do nascimento, vamos correr atrás para que eu e outras gestantes não vivamos o momento, que tanto planejamos e idealizamos, desamparadas”, declara. Por ser sua primeira gestação, ela diz estar consumida por medo e ansiedade. “Imagine como é difícil para mim pensar que vou estar cercada de gente que nunca vi na vida, sem um rosto conhecido para me passar segurança”, lamenta. As mulheres brasileiras não são as únicas a enfrentar o problema. Maria Booker, da Birthrights, uma instituição de caridade voltada a gestantes do Reino Unido, denuncia que alguns hospitais britânicos também estão fazendo as proibições. “É muito preocupante. As consequências e possíveis traumas de mulheres que dão à luz sozinhas vão muito além do coronavírus”, comentou em entrevista ao jornal Independent. No dia 22 de março, a rede de hospitais presbiterianos de Nova York, nos Estados Unidos, também decretou o fim das visitas. A medida foi logo seguida por outras maternidades da cidade, e relatos de mulheres que tiveram seus parceiros retirados à força por seguranças começaram a surgir. A situação só se normalizou quando o governador da metrópole norte-americana, Andrew Cuomo, interviu, exigindo que a proibição de acompanhantes para mulheres grávidas fosse encerrada.
Restrição na circulação de pessoas
O direito a um acompanhante ainda é permitido pela OMS, mas esforços para diminuir a circulação de pessoas em hospitais são essenciais em tempos de pandemia. Se antes entrar na sala de parto com o marido e um fotógrafo, por exemplo, era aceitável, agora não é mais. A tradicional apresentação do recém-nascido para os familiares no leito, um evento de confraternização permeado por lembrancinhas, doces e balões, também caiu por terra. A Maternidade Brasília, único centro exclusivo de cuidados à mamãe e ao bebê do DF, está sentindo os efeitos positivos da nova política de visitação que adotou como parte das medidas de combate à Covid-19. “Conseguimos diminuir em 95% o fluxo de pessoas externas, restringindo a apenas um acompanhante por paciente”, diz a gerente médica de qualidade da Maternidade Brasília, Sandi Sato. “Essa redução diminui drasticamente as possibilidades de contaminação dentro do hospital”, destaca. Além das restrições de acesso, muitos hospitais passaram a priorizar consultas por videoconferência para evitar aglomerações. Agora, a orientação das instituições médicas que optaram por essa ação é deixar o atendimento presencial apenas para casos de urgência e de gestantes na reta final da gravidez.