Recursos aumentaram, mas juros são praticamente iguais ao do ano anterior; ainda é cedo para dizer se Lula vai conseguir se aproximar do agro com esse programa
Por Kellen Severo
O Governo federal anunciou o Plano Safra 23/24 para médios e grandes produtores nesta terça-feira, 27. Antes da cerimônia oficial, os dados que apontavam aumento de volume de recursos e praticamente a manutenção dos juros já circulavam na internet. A cerimônia em Brasília não contou com nenhum detalhamento dos dados do Plano Safra nem adicionou informações ou diretrizes técnicas sobre seguro, volume de subvenção e itens práticos, por exemplo. Foi apenas um longo evento político e sem a presença de um secretário de Política Agrícola oficial, já que o cargo segue ocupado apenas interinamente desde o começo do governo. O volume anunciado ficou em R$ 364,22 bilhões (R$ 272,12 bi para custeio e comercialização e R$ 92,10 bi para investimentos) para médios e grandes agricultores, aumento de 26,8% em relação ao ano anterior. Nesta quarta-feira, 28, será feito o anúncio do Plano Safra da agricultura familiar. Os juros para o custeio da safra para médios produtores ficaram em 8% ao ano e para os demais agricultores em 12% ao ano, igual ao Plano Safra anterior. As taxas para linhas de investimentos variam de 7% a 12,5% ao ano, muito semelhantes ao ano safra passado. “A manutenção das taxas, na conjuntura atual, nós consideramos positivo diante da impossibilidade de redução. O volume foi consideravelmente superior ao anterior. Nós havíamos pedido R$ 410 bilhões (veio R$ 364,22 bilhões) mas não está ruim”, destacou o presidente da Organização das Cooperativas do Brasil (OCB).
Apesar da expectativa de queda da Selic nos próximos meses, o governo não baixou os juros para médios e grandes agricultores. “Havia uma expectativa de parte do setor por uma redução de juros, já que o presidente da República e o governo como um todo têm criticado sistematicamente os juros básicos da economia. Os juros não sofreram alterações relevantes apesar da expectativa de queda da Selic, conforme mostram tanto o Relatório Focus do Banco Central como também as curvas de juros futuras, ao contrário dos anos anteriores”, enfatiza o economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul, Antonio da Luz. Durante coletiva de imprensa, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, mencionou que o montante para o seguro rural ficou em R$ 2 bilhões. Além disso, o incremento no volume de recursos para construção de armazéns é bem-vindo, diante das supersafras e dificuldades atuais de armazenagem. “Em síntese o plano atende boa parte das demandas do setor”, disse o diretor técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária, Bruno Lucchi. A liberação dos recursos junto aos bancos dependerá de publicação da resolução do Conselho Monetário Nacional.
Plano Safra + Verde
Os produtores rurais que já estão com o Cadastro Ambiental Rural (CAR) analisado terão redução na taxa de juros nos empréstimos do Plano Safra em 0,5 ponto percentual. De acordo com boletim do Governo federal de abril, foram cadastrados 6.997.633 imóveis no Brasil, desses 1.824.853 passaram por algum tipo de análise (26%) e 65.357 tiveram a análise de regularidade ambiental concluída, ou seja, 0,93%. Além da análise do CAR, também terão direito à redução de 0,5 ponto percentual na taxa de juros de custeio os produtores que adotarem práticas de produção agropecuária consideradas mais sustentáveis, como: produção orgânica ou agroecológica, bioinsumos, tratamento de dejetos na suinocultura, pó de rocha e calcário, energia renovável na avicultura, rebanho bovino rastreado e certificação de sustentabilidade. A definição dessas práticas e a regulamentação de como elas serão comprovadas pelos produtores rurais junto às instituições financeiras, ocorrerá posteriormente ao lançamento do Plano Safra 2023/24.
Cerimônia
A cerimônia do Plano Safra foi uma das piores que tenho memória. Começou com um demorado discurso de um grande produtor de algodão. O espaço de prestígio foi dado em uma tentativa do governo de mostrar proximidade entre o agro e Lula. Na plateia, representantes de setores como algodão, alho e outras poucas áreas. Não estava lá o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Pedro Lupion, que de longe, em viagem, criticou o governo pela separação em duas cerimônias de grandes e pequenos agricultores, mas disse que há de se reconhecer o esforço do governo federal, especialmente do ministro da Agricultura. Pelo menos três ministros citaram nominalmente a bancada do Agro.
Haddad defendeu a reforma tributária. O único que, em poucos segundos, falou sobre as condições do Plano Safra foi o ministro da Agricultura, Fávaro. Os demais, focaram em desmatamento, sustentabilidade, críticas ao presidente do Banco Central. Uma sequência de problemas técnicos, desde vídeos que não rodaram e até falhas no microfone durante a fala do presidente, fizeram Lula criticar: “da próxima vez tem que mandar fazer uma manutenção”. Ao esconder o Plano Safra na própria cerimônia de divulgação do Plano Safra, me pergunto: por que separar uma cerimônia para divulgar o Plano Safra e falar de tudo, menos de Plano Safra? Talvez nem o governo tenha gostado do que apresentou e preferiu gastar o tempo com discursos em vez de apresentar e detalhar o Plano que construiu? Lula vai conseguir se aproximar do agro com esse Plano Safra? Cedo para dizer. Há informações incompletas, como o volume de subvenção para as taxas de juros e regulamentação do bônus para boas práticas. O plano precisa rodar para entendermos se ele realmente funcionará.