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EDITORIAL ESTADÃO: Um governo que alimenta conflitos

por Ornan Serapião
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Sem entender a complexidade do sistema tributário, Bolsonaro beneficia alguns setores da economia, mas prejudica outros

O acirramento das divergências entre a indústria do aço e a construção civil por causa dos preços de produtos siderúrgicos é consequência previsível do modo irresponsável com que o governo do presidente Jair Bolsonaro trata de temas essenciais da economia, como os tributos. Sem nunca ter se empenhado numa reformulação do sistema tributário, para dar-lhe funcionalidade e assegurar melhor distribuição de seu peso sobre os diferentes segmentos da economia e da sociedade, Bolsonaro tem utilizado os tributos para beneficiar parte dos contribuintes, sem atentar para perdas de outros. Como em muitos assuntos, Bolsonaro age apenas de acordo com seu interesse eleitoral, sem pensar no amanhã. Mas suas decisões têm consequências – e com frequência elas têm sido danosas para o País.

A disputa entre siderúrgicas e empresas de construção é um caso exemplar. Informado por representantes da construção de que produtos siderúrgicos haviam subido muito, o que poderia colocar em risco a capacidade do setor de gerar empregos, Bolsonaro entendeu que precisava agir.

Trata-se, afinal, de um setor responsável por boa parte do emprego no País e o vigor de sua atividade tem contribuído para a relativa estabilidade dos indicadores do mercado de trabalho. Em ano eleitoral, o eventual aumento da taxa de desemprego nos próximos meses por causa de problemas de custos da indústria da construção prejudicaria fortemente as pretensões eleitorais de Bolsonaro, que desde sua posse só está preocupado com sua reeleição. O governo decidiu então reduzir a tarifa de importação do aço, como noticiou o Estadão. Adicionalmente, a medida poderia propiciar algum alívio na inflação, outro fator prejudicial às pretensões eleitorais do presidente da República.

A indústria da construção comemorou a decisão. Mas a de aço se sentiu duramente prejudicada. Ela também tem grande peso na economia brasileira e compete interna e externamente com gigantes que atuam em escala global. Zerar a tarifa de produtos importados beneficiaria fortemente os produtores estrangeiros. Representantes do setor siderúrgico, por isso, foram a Brasília e, em reuniões com autoridades da área econômica, a começar pelo ministro Paulo Guedes, procuraram mostrar-lhes os efeitos negativos da medida.

Impostos sobre determinados bens ou serviços têm sido reduzidos ou aumentados pelo governo federal como meio para reduzir preços, bem como para aliviar ou aumentar pressões sobre determinados grupos de contribuintes. Não se conhece a lógica dessas medidas, se ela existe, mas seus impactos são na maioria previsíveis, e nem sempre na direção imaginada pelo governo. A tributação sobre combustíveis tem sido alterada para conter seus preços, mas estes continuam a subir, pois, como no caso do aço, muitos outros fatores os pressionam. Medidas compensatórias para evitar perdas de receita que ameacem as contas fiscais nem sempre são adotadas. E, agora, o governo alimenta disputas entre setores empresariais. O País não ganha com essa forma de agir do presidente.

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