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OPINIÃO: Gilmar Mendes e a realidade pelo avesso

por Ornan Serapião
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Gilmar Mendes – Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Bojana Danilovic, moça sérvia de 29 anos, moradora de Uzice, escreve e lê de cabeça para baixo. Transcrevo o que foi relatado a respeito pelo G1:

“Quando Bojana vê um objeto, ele é invertido na retina, que fica no fundo do olho. Seu cérebro, então, deveria reposicionar a imagem, para deixá-lo na direção correta – só que isso não acontece”.

Ela diz ser “a única pessoa no mundo a apresentar esse tipo de transtorno”.

No Brasil, temos um ministro do Supremo que sofre de problema semelhante na interpretação dos fatos. Em recente entrevista ao Estadão, o ministro – pasme, leitor! – afirmou que “a Operação Lava Jato provocou um ‘colapso’ no Judiciário, atingindo da primeira instância até o Superior Tribunal de Justiça (STJ). E acrescentou que essas instâncias sucumbiram a ‘pressões políticas’ da força-tarefa que comandou a operação em Curitiba.

“O STJ não cumpriu adequadamente seu papel”, repreendeu ele.

Você agora está liberado para rir o quanto quiser diante de tamanho descolamento da realidade. Foi tudo ao contrário do que o ministro afirmou e eu, até em benefício dele mesmo, gostaria que fosse, de fato, resultado de um distúrbio de percepção.

Não obstante, por demanda de seu espaçoso amor próprio, o ministro tenta emplacar uma narrativa. E o faz afirmando, diante da repulsa nacional ao ativismo do STF, que todo o Poder Judiciário Federal anda de passo errado enquanto só ele e quem com ele, anda de passo certo.

A sociedade assiste estarrecida ao empenho com que o STF aparelhado pelo PT destrói a credibilidade da Corte. Lê estarrecida uma entrevista em que tamanha negação da realidade é dita e passa batida. Triste Supremo! Triste jornalismo! Este último, não só assistiu como transmitiu a inteira sessão em que a Corte decidiu anular as ações contra Lula. Como podem comprar tão barato a afirmação de que era aquela a primeira vez que o Supremo examinava a questão da competência da 13ª Vara Federal de Curitiba para casos da Lava Jato?

Não vão me enlouquecer! Não foi isso que ouvi de Edson Fachin e não foi isso que ouvi de Rosa Weber quando votavam. Ambos referiram a “evolução das percepções” na Segunda Turma! O assunto era velho dentro do Supremo. A inacreditável decisão da semana passada revelou a face oculta de um Brasil das trevas, que volta a imergir na noite escura de nossas instituições.

O ministro, e quem pensa como ele, deveria ler o artigo publicado em Zero Hora do último fim de semana pelo digno e douto desembargador Luís Alberto Thompson Flors Lenz, do TRF-4 (que julga os recursos da Lava-Jato). O texto termina com esta afirmação:

“A Lava-Jato não vem sendo desconstituída por suas falhas e eventuais equívocos, e sim pelos seus incontáveis acertos, principalmente em defesa de um país minimamente digno”.

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Percival Puggina

Membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

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