Hoje, Dia Mundial do Trabalho, muitos trabalhadores não têm o que comemorar. Em meio à crise da pandemia do novo coronavírus, diversos não conseguem sequer levar o sustento para casa. Para piorar, a renda básica emergencial de R$ 600 do governo federal, para os informais, ainda não chegou para vários deles. Ontem, o IBGE divulgou que, no primeiro trimestre de 2020, o número de desocupados subiu 12,2% e já atinge 12,9 milhões de brasileiros, além de 36,8 milhões viverem na informalidade.
Vinicius Guilherme Câmara, 31 anos, conta que se viu obrigado a parar de vender doces nos ônibus na Zona Norte do Rio. “Há dois anos estou sem assinar carteira. Em junho passado, deixei de lado a timidez e passei a vender doces para sustentar minha família. Mas com a pandemia, as lojas fechando, não tinha como comprar. Parei em março, só que as contas continuam chegando e precisava trazer comida para casa”, disse, emocionado.
Para tentar reverter a situação, Vinicius teve a ideia de montar caixas com os doces que ainda tinha em casa e fazer serviço de entrega. “Já sou conhecido pela região do Méier e comecei a divulgar meus produtos. As pessoas me procuraram, não para comprar, mas para doar cesta básica ou uma ajuda financeira. Com a pandemia, fico muito preocupado pela minha filha, minha família. Peço a Deus para conseguir sustentá-los de forma honesta”, desabafou.
Para o pedreiro Israel Bruno, 34 anos, a história não é diferente. Na casa dele falta o básico: comida. “Preciso desse auxílio para fazer compras. Minha casa está zerada, estava na esperança de conseguir receber”, desabafou. Israel faz parte das centenas de trabalhadores que passaram a noite na fila da Caixa Econômica Federal, em Rocha Miranda, na esperança de receber os R$ 600. “Voltei frustrado. Cheguei na fila ontem, 23h30, e quando chegou na minha vez não consegui ser atendido, porque estava só com a carteira de trabalho. O atendente nem quis ouvir minha situação”, reclamou.
Já Catia Soares, de 53, trabalha como diarista e está contando com a ajuda de amigos e parentes. “Como não tenho trabalhado e entra pouco dinheiro, tenho recebido ajuda. As contas estão atrasadas, tenho um filho com necessidades especiais, o remédio é muito caro. Minha preocupação só aumenta, pois como vai ser daqui pra frente?”, questiona.
O administrador Diogo Rangel, de 33, perdeu o emprego no final do ano passado. Desde então ele se sustenta com o seguro-desemprego. Porém, em março, a oportunidade de voltar para o mercado de trabalho foi descartada por conta da pandemia. “Estava pronto para trabalhar em uma empresa em São Paulo, mas os planos da companhia mudou em razão da crise da pandemia. Peguei nesta semana minha última parcela do seguro-desemprego e, depois disso, não sei como farei”, disse ele.
Para Duda Quiroga, vice-presidente da Central Única dos Trabalhadores do Rio (CUT-RJ), diferentemente dos anos anteriores, o Dia do Trabalho será de angústia para muitos. “Será desesperador, pois muitos vivem a angústia da perda do emprego e outros estão à espera de receber o auxílio emergencial. A gente vai precisar de uma regulamentação urgente para os trabalhadores estarem protegidos e construir novas estratégias”, afirmou.
Manoel Peixinho, especialista em direito administrativo e institucional, reforçou que “este ano o primeiro de maio não vai ser um dia comemorativo, não tem como ter festa”. Para o advogado, a vontade de comemorar começou a se desfazer com a aprovação da reforma trabalhista, que “tirou conquistas históricas dos profissionais”. Manoel também analisou o cenário atual e afirmou: “essa pandemia revelou a face mais cruel do Brasil, que não enxerga as pessoas que já vivem à margem da sociedade. Este auxílio do governo é ineficaz, insuficiente e sequer aconteceu com a rapidez necessária”.
Covid escancara precariedades
Na avaliação do diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Fausto Augusto Junior, a pandemia escancarou a precariedade vivida pela classe trabalhadora no Brasil: “O trabalhador vive a insegurança no transporte público, a falta de equipamentos de proteção e poucas empresas se preocuparam em adotar medidas de precaução contra o vírus. E a pandemia evidencia a vulnerabilidade dos trabalhadores informais”.
Para ele, a perspectiva não é nada positiva. “Todas as medidas adotadas até aqui pelo governo federal foram pautadas para os empresários e com pouco apreço pela vida do trabalhador. É importante lembrar que o auxílio emergencial de R$ 600 veio do Congresso Nacional, por pressão da sociedade civil. A classe trabalhadora é penalizada”, completou Fausto.
Através de transmissão online, a CUT realiza nesta sexta-feira ato em defesa da saúde, emprego e renda com inúmeros artistas e ações para estimular solidariedade das pessoas. O evento vai contar com os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique Cardoso, além da participação do roqueiro inglês Roger Waters.
Já a prefeitura do Rio, por meio da Secretaria Municipal de Cultura, realiza o “Vira Rio Cultural”, com uma programação cultural online com duração de 24 horas. As atividades de dança, música, contação de histórias serão apresentadas por meio de vídeos gravados ou lives nas redes sociais.
O Dia