Criação do Conselho da Amazônia indica decisão de transformar a questão em assunto de Estado
Há dez dias, uma das maiores administradoras de fundos de investimentos enviou carta aos clientes alertando-os sobre uma inexorável reformulação dos fundamentos das finanças globais. E comunicou: “Estamos situando a sustentabilidade no epicentro da forma como a BlackRock administra riscos, constrói carteiras, desenha produtos e interage com as empresas”. Isso vai representar significativa mudança de rumo na gestão dos US$ 7,4 bilhões em ativos. “O capital não é nosso”, justificou o executivo-chefe Larry Fink, “pertence a pessoas que tratam de financiar seus objetivos de longo prazo, como a aposentadoria”. A sustentabilidade será o “pilar” dos investimentos da novaiorquina BlackRock. Essa perspectiva havia sido sinalizada em setembro por 230 financeiras, responsáveis por US$ 16,3 trilhões em investimentos, pouco mais que o Produto Interno Bruto da China. Na época, a Amazônia ardia em incêndios e havia protestos em cidades de todo o mundo contra a inércia de governos e empresas diante das mudanças climáticas. “Estamos preocupados com o impacto financeiro que o desmatamento (na Amazônia) pode ter sobre as empresas investidas, aumentando potencialmente os riscos de reputação, operacionais e regulatórios” — diziam os gestores de fundos em carta pública.Parecia ser apenas uma resposta aos donos do dinheiro incomodados com a sua associação ao impasse ambiental. Na semana passada, porém, o Fórum Econômico de Davos mostrou que existe algo além das conveniências politicamente corretas. Trata-se de lucro, como explicou a BlackRock a seus clientes e afirmaram gestores de fundos no evento anual na cidade suíça, cenário do romance A Montanha Mágica, do escritor alemão Thomas Mann. A novidade está na percepção de que estratégias de investimentos assentadas na sustentabilidade ambiental têm potencial de proporcionar melhores resultados aos donos do dinheiro. É mais do que proteção da imagem dos investidores ou prevenção a eventuais reações hostis a marcas e produtos específicos. Trata-se da abertura de uma nova e lucrativa fronteira de expansão dos negócios financeiros — aposta promissora, sintonizada com expectativas sociais de melhor qualidade de vida, com empresas ambientalmente sustentáveis lucrando mais que as outras. Faz parte da essência do desenvolvimento capitalista. O governo brasileiro, aparentemente, começa a compreender a mensagem. O anúncio da criação do Conselho da Amazônia, entregue ao vice-presidente Hamilton Mourão, indica a intenção de transformar a política ambiental em assunto de Estado, ultrapassando a inépcia que até agora caracterizou a gestão setorial, sob o ministro Ricardo Salles. É bom sinal. Sobra dinheiro no mundo. Dono da maior biodiversidade do planeta, o Brasil deveria atrair uma fração desses capitais para explorar de forma responsável este patrimônio.