O Brasil continua seguro. Não faltam, no entanto, sinais agourentos, dentro e fora do País, apesar da retomada do crescimento econômico.
Com dólares de sobra para cobrir a dívida externa e a balança comercial ainda no azul, o Brasil continua blindado contra choques, mas é preciso dar atenção a alguns sinais de alerta. As contas ficaram menos folgadas neste ano, as exportações perdem vigor, o cenário global permanece nublado e as projeções do comércio para 2020 são pouco otimistas. Neste ano o buraco nas transações correntes chegou a US$ 45,05 bilhões até novembro, com aumento de 27,18% em relação à marca de um ano antes. A piora resultou principalmente da redução do superávit comercial – uma queda de 26,39%, de US$ 47,07 bilhões para US$ 34,65 bilhões. Investidores e analistas costumam acompanhar com atenção as transações correntes, um importante indicador de segurança. Essas transações incluem três contas: a balança do comércio de bens, a de serviços e a de rendas. Geralmente no azul, o saldo comercial contrabalança em parte os déficits das duas outras contas. Também por isso é preciso seguir com cuidado o comércio de bens.Em 2019, o ingresso líquido de US$ 69,11 bilhões de investimento direto cobriu com folga, como tem ocorrido há anos, o buraco das transações correntes, segundo o relatório mensal sobre o setor externo apresentado na sexta-feira passada pelo Banco Central (BC). Esse tipo de recurso, dirigido à atividade empresarial, é normalmente a melhor forma de financiamento das transações correntes, por ser a mais segura e a mais produtiva. Entraram US$ 77,40 bilhões de investimento, em termos líquidos nos 12 meses até novembro. Esse valor correspondeu a 4,21% do Produto Interno Bruto (PIB) estimado pelos economistas do BC. No mesmo período o déficit em transações correntes chegou a US$ 51,16 bilhões, soma equivalente a 2,78% do PIB. A deterioração, embora sem ser alarmante, é sensível e vale alguma atenção dos formuladores da política econômica. Nos 12 meses terminados em novembro do ano passado aquela proporção havia ficado em 2,02%. Entre os meses finais de 2016 e setembro de 2018 havia sido sempre inferior a 2%. Houve um ligeiro recuo desde o mês anterior, quando o déficit alcançou 2,83% do PIB. Houve também uma revisão dos números. No relatório divulgado em novembro, a proporção registrada em outubro havia sido de 3%. De toda forma, a correção foi pequena e a melhora contabilizada de um mês para outro foi modesta. Mas a mudança em relação ao cenário de 2018 é muito visível e a deterioração é ainda mais sensível quando se consideram os dados de 2017. A folga deve ser bem menor no próximo ano, de acordo com as projeções do BC, apresentadas na quinta-feira passada em seu relatório trimestral de inflação. O déficit em transações correntes deve atingir US$ 57,7 bilhões, com aumento de 12,9% sobre os US$ 51,1 bilhões estimados para 2019. O rombo equivalerá a 3,1% do PIB. A causa principal será, novamente, a redução do superávit comercial, decorrente de uma diminuição de 0,44% no valor exportado e de um aumento de 3,2% nas despesas com a importação. O investimento direto ficará em US$ 80 bilhões, valor estimado também para este ano, e continuará mais que suficiente. Mas a folga será bem menor.A redução do superávit comercial será atribuível a um fator positivo – o maior crescimento econômico no Brasil, com mais consumo e mais investimento – e a pelo menos três negativos – a insegurança no mercado global, a continuação da crise argentina e a baixa competitividade da maior parte da indústria brasileira. Não se aumentará o poder de competição simplesmente baixando custos trabalhistas e recriando a CPMF, dois temas constantes do ministro da Economia. O custo Brasil é muito mais que isso.Com reservas de US$ 366,38 bilhões, dívida bruta de US$ 325,65 bilhões e déficit externo ainda administrável, o Brasil continua seguro. Não faltam, no entanto, sinais agourentos, dentro e fora do País, apesar da retomada do crescimento econômico. O capital é medroso e qualquer susto um pouco mais forte poderá torná-lo perigosamente escasso para as economias emergentes.